quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Infância Frivola

Ali, bem no cantinho do quarto, aonde duas paredes grandes e brancas se encontram, existe uma criança. Cansada, os pés descalços e frios, as mãos sujas e os braços envolta das pernas. Apertava tanto os joelhos contra o peito que machucava. Aflita, ela ofegava. Faltava muito ar para este pequeno pulmão. E havia muito medo para este imenso coração. Não havia mais ninguém que pudesse dar-lhe a mão. Esta, estava sozinha. Tantas coisas passavam-se em sua cabeça pequenina, não lhe era suportável tanta dor, tanta miséria. Era uma criança. Crianças deveriam sonhar, deveriam ser ingênuas. A beleza de ser uma criança. O sorriso puro, sem preocupações e sem problemas. Existiam crianças diferentes, sabia? Diferentes do Peter Pan, que poderia ir à Terra Nunca e nunca se preocupar em crescer. Diferentes das crianças cheias de brinquedos novos e caros. Diferentes das crianças que mesmo com poucos brinquedos, expeliam alegria, sem preocupações. Pensamentos vagos. Existiam crianças que se preocupavam, que sentiam dor, que não tinham brinquedos. E não tinham sonhos. Estas, que vagam pelo mundo, tão frágeis e sozinhas. Que teem no peito uma vida longa ou curta pela frente. Que sentem fome. Que sentem medo, medo de verdade. Não medo da bruxa do desenho animado na televisão. Medo de não ter o que comer, medo de se machucar na rua, medo que alguém lhes faça algum mau. Medo que o mundo as devore e leve seu último suspiro de alegria. Um último sorriso tranquilo, sem medo, sem passado, sem angustia. Nós, que tememos demasiado tantas coisas que podem vir, jamais pensamos naqueles que temem o minuto seguinte. Aqueles seres que por dentro, ainda que não vemos, teem tanta força escondida. Força para lutar contra cavaleiros, dragões, monstros gigantes. Força para um mundo que se constroi dentro deles mesmos. Força que depois, cresce ainda mais, quando chega-se ao mundo real. Quando crescemos. A força vem da criança que vemos nos carrinhos que uma mãe ou um pai guia, com um pequeno ser dentro, mostrando um sorriso até mesmo sem dentes ainda. Quando existem crianças assim, ainda existem forças. Mas, ainda há também, milhares de crianças presas em um canto escuro, com medo e tendo que encarar uma vida sem sonhos, sem magia e sem o encanto de ser uma verdadeira criança.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Me encanta

Quando ele andava, erguia o tronco, mas não muito - para que as costas continuassem levemente curvadas - as mãos pareciam serradas, pronto para dar um soco em alguém. Era engraçado vê-lo caminhar, parecia incrivelmente grande e resistente, forte. Como se qualquer coisa pudesse bater em seu peito e não feri-lo, de maneira alguma. Eu não saberia como tirar os olhos, era quase impossível. Quase, até que eu me lembrasse insistentemente que deveria parar, e parava. Com muito esforço. Quando eu passava ao seu lado, o cheiro do perfume e do banho era facilmente notável, até mesmo de longe. Não era preciso que ele chegasse muito perto, e bastava ele se aproximar mais um pouco para que meus braços implorassem pelo aconchego. E eu sempre conseguia uma parte do que os meus braços imploravam. Ele me envolvia nos braços, que quase me sentia na minha cama, era até mesmo quente. Eu consegui com ele quase tudo aquilo que desejava. O melhor dos melhores. Eu esqueci o que eu achei que não esqueceria, tudo por culpa daquele sorriso. Aquele! Aquele que você nunca esquece, que te deixa com cara de idiota, que te faz pedir mais e mais e mais e mais. Também não achei que, um dia, me sentiria tão patética por alguém. Não tanto assim, pelo menos. Eu ainda queria mais um pouco dele. Haviam dias em que eu não conseguiria saber o que estava sentindo, dias em que eu tentaria me desvendar o tempo inteiro e não acharia resposta. Mas nos outros dias, a maior parte dos dias, estaria estampado na minha testa que eu o amava, com todas as forças que existiam no meu corpo. E eu me odiava por isso, por amar tanto alguém e querer tanto agradar. Eu não costumava sentir isso, depois de tanto tempo, a sensação continua sendo muito nova para mim. E eu, certamente, não sentiria o meu corpo fervilhar com outra pessoa. Não acharia, muito provavelmente, em ninguém o que eu achei naquele do corpo firme, dos olhos castanhos, e que sorri da maneira mais encantadora possível e inimaginável.